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The Legend of Zelda: Majora’s Mask.

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Posted 02/03/2017 by in 3DS

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Nota:
 
 
 
 
 

5/ 5

Plataforma: ,
 
Título: The Legend of Zelda: Majora's Mask.
 
Desenvolvedor: Nintendo EAD.
 
Duração Média: 35 horas.
 
Diretor: Eiji Aonuma, Yoshiaki Koizume.
 
Compositor: Koji Kondo.
 
Roteirista: Mitsuhiro Takano, Shigeru Myamoto, Yoshiaki Koizume.
 
Resumo:

Mesmo tendo sido desenvolvido em apenas um ano, Majora’s Mask permanece sendo o título narrativamente mais ambicioso de sua franquia.

by Rodrigo Lopes C. O. de Azevedo
Full Article

Mesmo tendo sido desenvolvido em apenas um ano, The Legend of Zelda: Majora’s Mask permanece sendo o título narrativamente mais ambicioso de sua franquia. Estabelecendo uma atmosfera opressiva desde os primeiros minutos, o jogo deixa claro o intuito de apresentar um universo tenebroso, marcado pela forma com que aqueles que o habitam  relacionam-se com os conceitos de perda e morte.

Majora’s Mask tem seu início logo após os eventos de seu antecessor, Ocarina of Time, com o protagonista Link vagando por uma floresta em busca de uma antiga amiga. O garoto, porém, logo se depara com um duende chamado Skull Kid, que, usando uma estranha máscara, assusta seu cavalo e o leva a cair em um buraco dentro de uma árvore. Quando acorda, Link descobre que foi amaldiçoado e tomou a forma de uma criatura feita de madeira. Perseguindo seu algoz, ele chega ao mundo de Termina e é abordado por um vendedor de máscaras que o alerta sobre um pormenor de seu objetivo: se Link não conseguir readquirir a máscara Majora dentro de 72 horas, libertando os gigantes de cada região daquele mundo, a lua irá cair e matar todos ali.

O sistema mais importante do jogo envolve a passagem de tempo e o controle dessas 72 horas. Cada sessenta minutos em Termina equivale a 45 segundos reais, levando os três fatídicos dias a durarem aproximadamente uma hora de jogo. Felizmente, o jogador pode voltar no tempo tocando uma música, o que leva o protagonista de volta à manhã do primeiro dia.

Os diretores, Eiji Aonuma (que permaneceu como produtor da série) e Yoshiaki Koizume (que veio a dirigir o brilhante Mario Galaxy), não perdem a oportunidade de explorar ao máximo esse sistema, estimulando Link a interagir com todos os habitantes do lugar e a resolver seus problemas. Como o jogador encontra personagens demais para lidar em apenas uma hora de jogo e muitos estão realizando atos em diferentes pontos da cidade no mesmo horário, o sistema de ciclos temporais é crucial para permitir que o jogador seja capaz de conhecer todos sem sacrificar a verossimilhança comum em outros jogos, em que a rotina dos personagens é estática no tempo.

A maioria dos habitantes de Termina e da cidade de Clock Town, pelo contrário, tem uma rotina dinâmica durante esses três dias, movendo-se pela cidade sempre com um objetivo diferente e realizando seus afazeres a cada hora que passa. Enquanto uns estão trabalhando nos preparativos do festival local que celebra justamente o tempo, outros estão discutindo com o prefeito sobre o possível fim do mundo e pedindo a evacuação da cidade, e o resto está simplesmente imerso em suas rotinas, cuidando de seus negócios e problemas pessoais, alheio ao desastre iminente.

Esses habitantes muitas vezes apresentam arcos narrativos que necessitam do auxílio de Link para progredir. O carteiro da cidade, por exemplo, é caracterizado pela rigidez com que trata seu trabalho: sua agenda é imutável, jamais podendo ser modificada ou ignorada. Se Link tenta conversar com ele durante o serviço, o carteiro apenas reclama que está sendo atrasado e pede licença. No entanto, a queda da lua põe em xeque seus princípios, pois evacuar a cidade o forçaria a abandonar seu posto. Cabe ao jogador, portanto, arranjar uma solução que faça o personagem libertar-se de suas obrigações.

Majora’s Mask, devido a sua premissa, é repleto de personagens trágicos. A missão secundária com o maior destaque na narrativa, por exemplo, envolve o amor impossível de um casal de jovens apaixonados: mesmo que Link eventualmente consiga reuni-los, a lua irá cair e matá-los de qualquer forma se o herói não voltar no tempo, separando os dois novamente.

Essa constante reversão dos eventos constrói uma atmosfera opressiva carregada de desesperança. Cada vitória do protagonista em curar as mazelas daquele mundo é anulada pelo próprio ao final de cada ciclo. Os diretores ainda reforçam esse contraste ao tornar as mudanças que Link causa no mundo bem mais evidentes do que em Ocarina of Time. Quando o gigante da área de gelo é reanimado, por exemplo, toda a nevasca desaparece da região próxima, que adentra a primavera. Os locais acessíveis mudam com o rejuvenescimento da vegetação, mas o efeito permanece somente até Link voltar no tempo de novo, trazendo de volta o gelo.

Clock Town é o centro no qual todo o restante do jogo gira em torno. A cada nova área explorada, a cada máscara descoberta, a cada equipamento adquirido e templo conquistado, novas opções de diálogo, resoluções de conflito, lojas e possibilidades de interação tornam-se disponíveis na cidade. Dessa forma, um dos grandes feitos de Majora’s Mask é o paradoxo de proporcionar conteúdo novo com frequência mesmo repetindo os mesmos eventos continuamente e revertendo as situações para seu estado de origem.

Há diversos sistemas e mecânicas atuando em conjunto com os ciclos temporais para evitar que eles tornem-se frustrantes para jogador. Enquanto viajar no tempo faz Link perder todo seu dinheiro e munição, suas máscaras e equipamentos permanecem intactos. Isso permite que a coleta de itens pelo cenário seja mais frutífera, ao contrário do que acontecia em Ocarina of Time, em que não raro o jogador já estava com sua capacidade tanto de munição quanto de dinheiro maximizadas quando era “recompensado” com mais de cada. Certas músicas que Link pode aprender também facilitam a vida: uma triplica a duração de cada hora, dando mais tranquilidade para o jogador quanto ao limite de tempo para resolver os desafios do jogo, uma outra avança Link para a exata hora do dia que ele quer estar (na versão original, só era permitido pular de seis em seis horas com essa melodia) e uma terceira possibilita teletransporte para certas áreas chaves do mapa.

Como o título do jogo indica, Majora’s Mask introduz ainda um sistema de máscaras em que elas assumem as mais variadas funções. Primordialmente, elas são as ferramentas necessárias para ajudar as pessoas ao redor de Link, seja ensinando duas dançarinas frustradas com a máscara de seu antigo mentor ou vestindo uma que causa insônia, deixando uma senhora feliz por impedir que Link durma durante suas histórias. Algumas, porém, também são úteis para o próprio protagonista, como a Bomb Mask que substitui as bombas – dispensando a necessidade constante de sua coleta, embora cause dano em Link – e o Bunny Hood que permite que ele movimente-se mais rápido. Já outras transformam Link em três espécies diferentes (Deku, Goron e Zora), permitindo novas formas de interação tanto com o ambiente – Zoras conseguem respirar debaixo d’água, enquanto Gorons são capazes de rolar por rampas íngremes, por exemplo – quanto com certos personagens, que só se abrem para o protagonista por acreditar ser ele outra pessoa.

Tratando-se de um jogo de aventura, os feitos de Link e os locais que ele visita são os mais variados. Em um momento ele está se esgueirando por um palácio de Deku para salvar um macaquinho de ser queimado injustamente pelo rei do lugar, no segundo está barganhando com espíritos para auxiliar um povo prestes a morrer congelado e, no terceiro, fingindo ser um guitarrista e tocando em uma banda formada por criaturas aquáticas.

Tratando-se de um título da série The Legend of Zelda, Majora’s Mask tem o progresso do jogador marcado pela conquista de templos especiais repletos de enigmas. Embora venham em número menor, comparando a Ocarina of Time, elas compensam em complexidade. Se as dungeons daquele título tinham a maior parte de seus puzzles contidos em suas respectivas salas, aqui os templos são mais abertos para exploração e requerem que o jogador entenda a extensão de sua arquitetura. Não é à toa, por exemplo, que um único templo em Ocarina of Time contenha quase tantas portas trancadas quanto Majora’s Mask inteiro, com suas míseras nove chaves totais.

Em Snowhead Temple, por exemplo, os enigmas com prioridade são os espaciais. A lógica dos desafios não é mais como acertar dispositivos, matar inimigos e acender tochas, mas como alcançar determinadas plataformas, como chegar a certos andares. Aqui, mover o imenso bloco para seu lugar correspondente é apenas o começo do quebra-cabeça. O desafio principal é descobrir como ir para cima dele, agora que seu topo tornou-se uma plataforma.

Snowhead Temple, em especial, trabalha com verticalidade, apresentando uma torre central que permite a movimentação pelos andares pulando de um para outro. O único problema de seu desenho é que, caso o jogador calcule mal a distância,  errando o pulo e caindo até a base da torre, ele vai ter que subir alguns andares de novo até onde estava.

Enquanto isso, Great Bay Temple explora a ideia de correntes de água com bastante variedade: o jogador deve liberar o fluxo pelos canos, usar água como alavanca, manipulá-la congelando e derretendo o gelo de suas fontes e até mesmo alterar a direção das correntes, abrindo caminho para novas salas.   

Em vez de travar o avanço do jogador com inúmeras  portas trancadas como o famigerado Templo da Água em Ocarina of Time, Great Bay Temple é construído por vários corredores subaquáticos conectando seus espaços, o que permite um desenho menos linear. O baú com a chave para o chefe, por exemplo, pode ser aberto em qualquer momento a partir da metade e, como um dos corredores pegos com mais frequência passa por sua sala, o jogador pode escolher quando tentar abri-lo. Aliás, só essa sala do baú possui duas fadas escondidas, dois baús e dois tipos diferentes de inimigos, além de uma porta que só pode ser alcançada com o item especial do labirinto.  Trata-se de um padrão do desenho do templo: cada sala não possui um único enigma, mas inúmeras atividades.

Great Bay Temple ainda se beneficia por ter dois chefes secundários mecanicamente diferentes, que compensam o vai e vem na água com picos de tensão. Sobre a versão de 3DS, também é importante apontar que a luta contra o chefe principal, Gyorg, foi refeita,  agora trazendo duas fases distintas: a primeira com Link e a outra obrigatoriamente como Zora, necessitando de sua habilidade de lançar barbatanas para acertar minas, levando o monstro a engoli-las. Apesar de ser melhor do que a luta da versão original, as minas não são preparadas durante o templo, sendo introduzidas apenas na luta. Desse modo, embora a ideia de fazer monstros comer bombas seja antiga na série,  as minas continuam sendo um tropeço no design da revisão do jogo.

Já uma excelente adição aos templos em qualquer versão de Majora’s Mask é a coleta de fadas. Em cada dungeon há quinze delas escondidas dentro de potes, baús ou engolidas por inimigos. Ao contrário das Skultullas de Ocarina of Time, que se tornam irrelevantes a partir da metade, salvar todas as fadas de um templo dentro do mesmo ciclo de três dias gera recompensas úteis, como, por exemplo, ter sua barra de magia dobrada – essencial para nadar como Zora sem estresse. As fadas são uma excelente inclusão, pois proporcionam quinze desafios opcionais em cada templo, entregando a eles uma carga maior de complexidade e não linearidade, visto que estimulam a observação cuidadosa de cada espaço e podem ser coletadas em qualquer ordem. 

Outra melhoria significativa em comparação a seu antecessor é dar uma utilidade maior a seu sistema financeiro. O jogo traz vários minigames de tiro ao alvo, caça ao tesouro e corrida que cobram pela entrada e introduz um banco para armazenar o dinheiro coletado e preservá-lo durante a viagem no tempo (sabe-se lá como), recompensando aquele que conseguir economizar mais de 5000 rupees.

Todavia, o elemento que mais salta de Majora’s Mask e que o coloca a parte do restante da franquia é sua atmosfera sombria, que equilibra elementos que causam terror com aqueles que causam estranheza. Como o protagonista vai parar em Termina por um buraco em uma árvore, a referência da premissa a Alice no País das Maravilhas é evidente. Assim como na obra de Lewis Carol, o universo fantástico de Majora’s Mask pode ser analisado como uma alegoria para os conflitos internos do protagonista: sua solidão é refletida na forma com que todos os personagens a seu redor tem que lidar com o sentimento de perda, muitas vezes manifestada na figura da morte.

Como alguns personagens afirmam, Link é o único ali ainda lutando contraessa sina: sua jornada para recuperar sua amiga e salvar Termina é também um embate contra o destino. E se ele é capaz impedir algumas fatalidades durante sua aventura, outras se mostram acima de seus poderes: Link pode resgatar o macaco do palácio Deku ou ajudar a bruxa Koume na floresta, mas o Zora que encontra na baía está fadado a morrer em seus braços. Além disso, é tematicamente apropriado que os efeitos de suas ações sejam inevitavelmente revertidos ao final das 72 horas: enfrentar a morte trata-se, afinal, de uma luta em vão.

Sendo um pouco obscuro quanto às minúcias desse tema, Majora’s Mask é capaz de gerar inúmeras interpretações sobre a exata natureza da alegoria, possibilitando teorias que afirmam que Link já está morto, precisando lidar com a própria mortalidade, ou que foi sua amiga – provavelmente Na’vi de Ocarina of Time – que pereceu. Uma das teorias que melhor aprofundam o tema do jogo é a que aponta como cada região de Termina pode representar um estado de luto de Elizabeth Kubler-Ross: os Dekus, cegos por sua fúria, estão prestes a queimar um inocente, enquanto um espírito Goron não hesita em barganhar com Link para ajudar seu povo e uma cantora Zora está imersa em depressão sem conseguir sequer falar. Independentemente da interpretação, Majora’s Mask constrói a imagem de Link como um combatente do destino, tentando impedir ou reverter a inevitável morte daqueles a seu redor.

Isso entrega um clima macabro ao jogo, que é constantemente potencializado por outros elementos. O texto da cena que abre Majora’s Mask, por exemplo, evidencia um cuidado particular com a escolha lexical, graças à preferência a termos relacionados a um campo semântico mais perturbador: Link não simplesmente “sai” de Hyrule em busca de sua amiga, ele “creeps out of Hyrule”. O encontro com Skull Kid, por sua vez, é emblemático: em movimentos retorcidos, a máscara vai tomando forma aos poucos na névoa da floresta, enquanto a risada do personagem parece ser formada por duas sobrepostas, gerando um efeito de estranheza. A própria transformação de Link em Deku assume contornos de pesadelo, com o protagonista correndo continuamente e sem escapatória em um fundo preto, cercado por inúmeras figuras ameaçadoras e gigantes.

Essa atmosfera vai sendo sempre amplificada no decorrer da aventura. O Mirror Shield, por exemplo, vem com um rosto de pânico gravado no vidro, que, após ser adquirido, irá ficar virado para o jogador, encarando-o até o final da aventura. O vendedor de máscaras que explica a missão a Link é igualmente assustador, visto que seus movimentos são realizados entre quebra de quadros, surgindo muito súbitos, quase como um teletransporte. Já as máscaras principais que Link veste geram um animação em que ele grita de dor e angústia.

Majora’s Mask é ainda um dos raros jogos a trabalhar com a razão de aspecto da imagem, diminuindo-a a cada badalada para um novo dia, o que enjaula o protagonista, resultando em um potente efeito de claustrofobia.

Enquanto isso, as situações em que o protagonista se encontra geralmente beiram o bizarro: em uma missão Link precisa impedir que vacas sejam abduzidas por alienígenas, enquanto no meio de outra ele pode assistir a múmias fazendo dança cossaca dentro das ruínas de um castelo assombrado.

A arte dos cenários e dos personagens, aliás, é admirável. Clock Town é cercada de grafites tribais, sugerindo a excentricidade do lugar, enquanto o vendedor de máscaras tem seu nome inofensivo (Happy Mask Salesman) contrastando com sua aparência amedrontadora: a máscara que carrega ao lado de seu rosto contém uma expressão eternizada em puro pavor, enquanto a do Mario em suas costas encontra-se posicionada entre a do demônio de Insidious e a uma que certamente representa Satã. O personagem ainda veste roxo, cor geralmente associada à morte e que aqui surge relacionada aos feitiços de Skull Kid, à fada que acompanha o antagonista, a um personagem amaldiçoado e ao prefeito da cidade onde todos estão fadados a morrer.

Por fim, a trilha sonora composta por Koji Kondo permanece umas das mais brilhantes e complexas da franquia. O tema de Clock Town, por exemplo, apresenta três variações. A primeira é alegre, apropriadamente alheia ao desastre que se aproxima.  Como o segundo dia é chuvoso, os instrumentos são trocados para refletir um tom mais melancólico: sai a percussão e entra o violino e a ocarina. A terceira versão é a mais impressionante: o ritmo da melodia é acelerado, transmitindo urgência, mas o efeito principal é o de tragédia iminente, gerado por um acorde grave contínuo no fundo. Já a música tema do jogo, Song of Healing, é ao mesmo tempo triste e fatalista. Ela é repleta de pathos, uma vez que o contraste entre o campo semântico positivo de seu nome e o elemento trágico contido em sua melodia ilustra perfeitamente o paradoxo de seu uso na narrativa: a cura que ela oferece é uma prisão, livrando as almas de seus tormentos enquanto as atrela para sempre a máscaras. 

The Legend of Zelda: Majora’s Mask é um título sem igual na franquia, ousando trazer mais de um sistema único e complexo para complementar suas mecânicas, além de construir uma atmosfera sufocante e pesada e ainda contar uma história tão ambiciosa que, até o presente momento, todos os títulos subsequentes não conseguiram superar.

por Rodrigo Lopes C. O. de Azevedo.

03 de fevereiro de 2017.


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Rodrigo Lopes C. O. de Azevedo


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