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A Culpa é das Estrelas.

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Posted 03/15/2015 by in Romance

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Nota:
 
 
 
 
 

3/ 5

Sumário

Genero:
 
Autor:
 
Editora:
 
Idioma Original:
 
Título: A Culpa é das Estrelas.
 
Título Original: The Fault in Our Stars.
 
Tradução: Renata Pettengill.
 
Edição: 2012.
 
Páginas: 286.
 
Capa: Rodrigo Corral.
 
Resumo:

A Culpa é das Estrelas não é um livro sobre câncer, a morte é apenas o elemento que o autor se utiliza para formar a história de amor de seus personagens e deixá-la relevante. E justamente por ser trágica, ela funciona por tornar inevitável que o leitor se emocione durante a leitura – por mais que John Green sabote a experiência regularmente.

by Rodrigo Lopes C. O. de Azevedo
Full Article

Logo no início de A Culpa é das Estrelas, a protagonista, Hazel Grace, tece um comentário metalinguístico sobre seu livro favorito: “…esta não é uma história de câncer, porque livros assim são um horror”A Culpa é das Estrelas, de John Green, de fato, não é um livro sobre câncer. Ele é um romance povoado por personagens que precisam enfrentar o prospecto da morte todos os dias. A diferença entre os gêneros é simples: em vez de ser dominada pela melancolia, a história é primordialmente comovente.

Hazel Grace é uma garota com câncer de tireoide que, durante um dos encontros de seu grupo de apoio, conhece um jovem que não hesita em convidá-la para assistir a um filme em sua casa no mesmo dia. Seu nome é Augustus Waters, um rapaz bonito e despojado que perdeu uma das pernas devido a um osteossarcoma.

O encontro deles ocorre logo no primeiro capítulo – o livro é bem objetivo, contendo pouquíssimos eventos desnecessários – e a história de amor não demora para ser desenvolvida. Green, por sinal, constrói o início de forma tão ágil que o leitor não tem tempo suficiente para conhecer os personagens antes do relacionamento começar. Todavia, tal ritmo não representa necessariamente um defeito na narrativa, pois, embora não seja comum duas pessoas começarem um relacionamento tão rápido, não há absolutamente nada de condenável na ação. O livro, aliás, apresenta uma breve crítica às limitações que as pessoas se impõem para convidar outras para um encontro, apresentando a situação com diálogos simples e diretos que, sempre tendendo para o humor, até mesmo ironizam o principal problema do imediatismo do pedido de Augustus (“Eu mal conheço você, Augustus Waters. Você pode muito bem ser o assassino do machado”). É uma pena, portanto, que o autor não tenha decidido explorar mais o assunto, deixando a cargo do leitor qualquer reflexão adicional.

Além disso, como a morte é o elemento motor da narrativa, nada mais natural que uma sensação de urgência esteja presente. As revelações, portanto, são entregues ao leitor de forma praticamente súbita e os acontecimentos são descritos rapidamente. Como o livro é também centrado em personagens jovens, essa agilidade narrativa se mostra ainda mais justificada por transmitir a visão de mundo típica da idade.

O autor, porém, não parece se esforçar muito para conferir autenticidade à rotina de seus personagens, se limitando a descrevê-la dentro dos arquétipos do gênero. A protagonista adora America’s Next Top Model, por exemplo, e sai com a melhor amiga para comprar roupas. Enquanto isso, Augustus curte jogar videogames com o amigo, ver filmes violentos e ainda jogava basquete antes de sua doença.

É inegável que, ao analisar seu hábitos, os personagens de A Culpa é das Estrelas surgem incrivelmente genéricos. Contudo, seus sonhos e conflitos internos são  peculiares o suficiente para conferir identidade própria ao casal. Hazel é uma voraz leitora de livros que, inteligente e questionadora, ainda retém ingenuidade o suficiente para acreditar que seu autor favorito irá lhe contar o que acontece com os personagens de uma de suas obras após o término da mesma. Já Augustus é um garoto que acredita viver em um mundo de metáforas, que gosta de equiparar o amor a um grito no vácuo e que teme bem mais ser esquecido do que morrer. Ou seja, embora se configurem personagens superficialmente pobres, eles apresentam aspirações singulares o suficiente para torná-los interessantes para o leitor.

O relacionamento de Hazel e Augusts, devido a suas doenças, é invariavelmente pautado pelo prospecto da morte com direito a cada um encarar o evento a sua própria maneira. Enquanto ela se enxerga com uma “granada” e se preocupa com o dano que causará às outras pessoas, preferindo poupá-las da dor se afastando delas, ele atua no modo “antes que seja tarde demais”, não deixando de aproveitar o tempo que lhe resta da melhor forma possível.

O contraponto entre essas ideias constrói o louvável tema do livro: não é porque um relacionamento está fadado a terminar que ele não deve começar. O autor utiliza o fatalismo inerente à condição deles para criticar conceitos similares ao posto pela amiga de Hazel, que realizou um “término preventivo de namoro”. Apresentando os personagens principais perto de morrer, Green questiona se não são todos os relacionamentos que um dia acabarão, nem que por consequência da morte de uma das partes, e que, por esse motivo, é uma bobagem tentar impedir uma relação de começar somente para prevenir a dor resultante de seu término.

Ao mesmo tempo, para justamente evitar que o tema do livro acabe tornando-o melodramático, Green faz seus personagens tratarem suas doenças com um divertido misto de humor e ironia. Sua tática é quebrar a melancolia com alívio cômico para que o romance não perca o destaque. A protagonista, por exemplo, volta e meia apresenta ao leitor os vários episódios que já lhe ocorreram com algumas piadas (“Contei ao Augustus a versão resumida do meu milagre: diagnosticada com câncer de tireoide em estágio IV aos treze anos. (Não contei que o diagnóstico veio três meses depois da minha primeira menstruação. Tipo: Parabéns! Você já é uma mulher. Agora morra.) E, foi o que nos disseram, era incurável”) e ela até mesmo chega a chamar seu concentrador de oxigênio de Felipe “porque simplesmente tinha cara de Felipe”.

O autor trabalha bem a condução narrativa, colocando um ponto de virada no meio do livro – o encontro com o autor favorito de Hazel, Peter Van Houten – e fazendo quase a totalidade dos personagens cumprir alguma função dentro da história. É igualmente perceptível o cuidado de Green ao construir sua narrativa ao observar os vários detalhes posicionados no meio dos diálogos e da ação, como a presença intermitente da morte nos vários locais em que o casal namora: eles se beijam na casa de Anne Frank, por exemplo. Outro ponto a ser notado é a transição da forma com que Hazel chama seu namorado – após uma revelação na metade do livro ela passa a usar muito mais seu apelido, Gus, do que seu nome Augustus – e como esse mudança reforça a extensão da fragilidade do rapaz: se antes ele era chamado pelo mesmo nome de um imperador romano, depois é seu apelido que ganha destaque. É verdade, porém, que tais elementos não são nem um pouco sutis na narrativa, chegando ao ponto de os personagens apontarem o significado deles, caso o leitor não os tenha percebido.

O autor de A Culpa é das Estrelas, afinal, tem sua parcela de defeitos. Basta observar que sua prosa surge bastante pretensiosa em vários momentos, uma vez que ele coloca muitas frases de efeito para forçar o leitor a refletir ou se chocar. Algumas conseguem funcionar – particularmente a que a mãe de Hazel sussurra ao pai uma hora –, mas a maioria não consegue sobrepujar o efeito que a enorme quantidade delas causa no leitor: quando o pai de Hazel a ensina sobre como “o universo quer ser notado”, o termo ‘universo’ poderia muito bem ter sido substituído por ‘autor’, visto que  Green constantemente chama a atenção  para si mesmo, arrancando o leitor da história.

O que leva a outro problema do livro. Todos os personagens falam da mesma forma, fazem as mesmas piadas e são obcecados por metáforas. Apesar de apresentarem personalidades completamente diferentes, não há individualidade nos diálogos de cada um. Perceba como todos ironizam a doença que tem – até mesmo o amigo deles, Isaac –, brincam com a forma com que as pessoas se apresentam (“Só Hazel”“Alison Minha Enfermeira”) e possuem seus momentos de filósofo, viajando nas comparações e reflexões. No instante em que até mesmo um garçom se aproxima da protagonista e pergunta se ela deseja “beber mais estrelas” ao oferecer um champanhe, o leitor refletirá se Augustus não tem realmente razão em acreditar que vive em um mundo de metáforas. A exceção fica com Peter Van Houten que, além de usar um vocabulário requintado, soa também mais amargo que os demais.

O autor também tropeça constantemente no exagero, o que fica consideravelmente evidente durante uma cena em que, numa viagem de avião em que o casal está assistindo ao filme 300, Augustus é descrito gritando euforicamente “Finalizado!” sempre que algum personagem morre, algo que nenhum ser humano com mais de oito anos faria em um avião.

A Culpa é das Estrelas não é um livro sobre câncer, a morte é apenas o elemento que o autor se utiliza para formar a história de amor de seus personagens e deixá-la relevante. E justamente por ser trágica, ela funciona por tornar inevitável que o leitor se emocione durante a leitura – por mais que John Green sabote a experiência regularmente.

por Rodrigo Lopes C. O. de Azevedo.

Publicado originalmente em 06 de Junho de 2014.


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Rodrigo Lopes C. O. de Azevedo


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