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A garota no trem.

7
Posted 04/18/2016 by in Suspense

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Nota:
 
 
 
 
 

2/ 5

Sumário

Genero:
 
Autor:
 
Editora:
 
Idioma Original:
 
Título: A garota no trem.
 
Título Original: The Girl on the Train.
 
Tradução: Simone Campos.
 
Edição: 2015.
 
Páginas: 377.
 
Capa: Mett Bretag.
 
Resumo:

Com uma trama previsível e uma protagonista problemática, A garota no trem revela ser um livro fraco tanto em seu suspense quanto no desenvolvimento de seu tema.

by Rodrigo Lopes C. O. de Azevedo
Full Article

A garota no trem, romance escrito por Paula Hawkins, é um livro de suspense que se propõe a discutir os problemas de casamentos não funcionais sob uma perspectiva feminina. No entanto, seus personagens rasos, a inconsistência do desenvolvimento de sua temática e o suspense mal construído prejudicam imensamente a obra.

A protagonista, Rachel, é uma mulher deprimida, desempregada e alcoólatra que vive de favor com uma amiga. Fingindo ir ao trabalho diariamente, ela pega o trem das 8:04 para Londres, que passa justamente ao lado da casa de seu ex-marido, Tom. No percurso, Rachel começa a observar a rotina de um casal vizinho a Tom e apelida-os carinhosamente de Jesse e Jason, passando a idealizar a vida deles. No entanto, um dia após assistir a Jesse beijar outro homem em sua varanda, ela descobre que a mulher está desaparecida e que ela acabou de se tornar uma importante testemunha para o caso.

Rachel já de início desperta a antipatia do leitor. Destruída pela bebida, a personagem surge extremamente propensa a tomar atitudes que a própria considera estúpidas. Em certo momento, ela se descreve de forma bem didática: “A Rachel bêbada não mede as consequências, ela é excessivamente expansiva e otimista ou envolta em ódio. Ela não tem passado, nem futuro. Ela só existe naquele momento”.

Sua postura com relação a bebida (ela constantemente reflete sobre os problemas oriundos de seu vício… enquanto está terminando uma garrafa) é sintomática, uma vez que é limitada ao alcoolismo da personagem, revelando-se um fator intrínseco a sua personalidade. Rachel constantemente pensa que determinado plano não é sensato para logo em seguida o por em prática. Ela é definida pelos seus “eu não devia, mas fiz” que se expandem em níveis alarmantes: “Eu não devia visitar a casa do meu ex-marido; Eu não devia entrar pela porta dos fundos sem me identificar; Eu não devia tirar o bebê dele do berço e carregá-lo até a linha do trem…”. Em outras palavras, Hawkins não faz do alcoolismo apenas uma característica importante da protagonista, mas a define a partir dele. Não é apenas a “Rachel bêbada” que é assim, cometendo atos irracionais, mas ela por completo.

Não obstante, ainda há cenas em que suas recusas em agir de forma racional não têm qualquer razão de ser, surgindo como um mero recurso da autora para prolongar o suspense: Rachel chega a esperar por determinada pessoa embaixo da chuva apenas para ter uma oportunidade de questioná-la, mas quando finalmente a encontra em uma situação corriqueira, e ainda por cima estando sóbria, permanece calada, pensando “Eu deveria lhe perguntar alguma coisa”, mas jamais o fazendo. A antipatia do leitor, portanto, é resultante não somente das decisões insanas da protagonista, mas de sua simplicidade e previsibilidade.

Rachel é cheia de momentos que a tornam mais um instrumento narrativo do que um indivíduo propriamente dito. Sua necessidade de descobrir o que ocorreu com Megan – o nome verdadeiro de Jess –, por exemplo, é impulsionada pelo mesmo fator “eu não devia, mas”, deixando-a repetitiva em suas motivações. No mesmo sentido, seu alcoolismo, que a torna uma narradora não confiável, é o único fator que impede o mistério de ser solucionado imediatamente: Rachel acredita ter presenciado um crime ao ter ido confrontar Tom na noite do desaparecimento, mas não se lembra dos detalhes porque estava bêbada. Seu plano é, então, tentar reviver as condições daquela noite para acionar sua memória. Memória esta que ainda se modifica convenientemente de forma a se adequar às necessidades narrativas do momento: se o fim é fazer o leitor suspeitar de Anna, a nova mulher de Tom, Rachel passa a inserir sua imagem nos eventos.

A garota no trem é narrado sob a perspectiva de Megan e Anna, além da protagonista. As duas, todavia, não se mostram mais complexas que Rachel. Primeiramente, Hawkins erra ao não dar uma voz distinta a cada uma, que não raro parecem pensar da mesma forma, incluindo até suas próprias parcelas de “não devia, mas”. Em segundo lugar, o que diferencia as três é uma característica única – Rachel bebe, Megan nunca está satisfeita com a vida e Anna odeia Rachel (e isso é basicamente Anna) – o que torna os capítulos repetitivos.

O livro ser narrado em primeira pessoa, portanto, revela-se uma faca de dois gumes, visto que aproxima o leitor das personagens, convidando-o a sentir alguma empatia, mas, por outro lado, torna a narrativa cansativa por elas baterem sempre na mesma tecla.

Além disso, esse recurso também estabelece a perspectiva feminina como ponto central da história, cujos principais eventos envolvem casos de violência doméstica. Nesse ponto, a autora comete um erro grave ao construir suas personagens de forma estereotipada: além de ter a mesma voz, tanto Rachel, quanto Megan e Anna são propensas a ataques de histeria e loucura, mostrando-se mulheres emocionalmente descontroladas, obcecadas por controle, que gritam, choram e até partem para o ataque físico quando contrariadas. Mulheres que surgem dependentes de seus homens tanto emocional quanto financeiramente. Já eles justificam suas agressões com a afirmação de que “perderam o controle” – que não conseguiram aguentar a insanidade delas.

A garota no trem discute misoginia, expondo o abuso emocional perpetrado por homens que não somente batem em suas parceiras como ainda as culpam pelo ato, além de constantemente desmerecê-las e xingá-las. Contraditoriamente, entretanto, também reforça os piores estereótipos do gênero, apresentando uma galeria de personagens femininas superficiais.

O livro falha igualmente na construção do suspense. Hawkins não é sutil ao estabelecer os possíveis suspeitos, fazendo volta e meia os personagens pensarem “não é estranho que tal fulano…”  e chegando ao cúmulo de colocar uma cena de sonho em que Rachel assiste a um indivíduo estrangular Megan – basicamente apontando para ele com setas vermelhas e fazendo qualquer leitor minimamente experiente já descartar a possibilidade de o sujeito ser realmente o culpado.

A estrutura do livro também se revela problemática. De um lado, mostra-se inspirada ao refletir os apagões que a bebedeira causa na protagonista – os capítulos são separados em “manhã” e “noite”, deixando um largo buraco em parte dos dias – mas, de outro, não é consistente em sua lógica, uma vez que está presente, mesmo que em menor escala, nas perspectivas de Megan e Anna. Além disso, a presença de Anna revela outro problema: Rachel é a protagonista, Megan é a vítima e Anna, aparentemente, não é ninguém importante para o desenrolar dos acontecimentos. Ou seja, seus capítulos ou revelam de antemão uma reviravolta, ou são inúteis – afinal, se fosse para trazer o ponto de vista de todas as mulheres, o da amiga com que Rachel vive estaria presente.

Não aproveitando sequer a oposição entre Rachel e Megan – uma sofre por não ter tido filhos, a outra se martiriza justamente por ter – que não leva a absolutamente nada, Hawkins só acerta ao fazer a grande reviravolta do livro ter profunda ligação com seu tema – mesmo que esta seja descoberta por seus personagens de forma arbitrária.  

Por trazer uma trama de suspense fundamentada em casamentos não funcionais e um narrador não confiável, A garota no trem guarda profundas semelhanças com o romance de Gillian Flynn, Garota Exemplar. Porém, ao contrário de Flynn, Hawkins não apresenta nenhuma dinâmica complexa ou estrutura elaborada, empalidecendo em comparação.

Com uma trama previsível e uma protagonista problemática, A garota no trem revela ser um livro fraco tanto em seu suspense quanto no desenvolvimento de seu tema.

por Rodrigo Lopes C. O. de Azevedo.

18 de abril de 2016.


About the Author

Rodrigo Lopes C. O. de Azevedo


7 Comments


  1.  

    Olá Rodrigo. Eu já li esse livro e gostei bastante do enredo, pelo menos essa é minha opinião. Acho que a autora desenvolveu muito bem os personagens e as cenas. Estou bem ansiosa para ver como ficará o filme. Que pena que a leitura não foi tão proveitosa para você e de qualquer maneira concordo que algumas situações foram um tanto previsíveis sim.
    Boas leituras!!!!
    Beijos, Fer




  2.  

    Olá Rodrigo,
    Que pena que o livro não foi tudo isso que era esperado.
    Acho que a trama não foi bem construída, o que é triste, porque tinha uma premissa muito legal.
    Sinceramente, tenho curiosidade de ler o livro, mas me desanimei muito após ler sua resenha.
    Beijos,
    Um Oceano de Histórias




  3.  

    Oi Rodrigo, tudo bem? Adorei a sua resenha, ainda que ela tenha sido negativa.
    Estou com vontade de ler o livro desde o lançamento, mas ainda não consegui 😛
    Espero ter a oportunidade de fazer isso logo. E espero gostar, apesar de que pelos pontos que você apontou, não sei se isso irá rolar 😛
    Beijoooos
    http://profissao-escritor.blogspot.com.br/




  4.  

    Olá!! 🙂

    “Por trazer uma trama de suspense fundamentada em casamentos não funcionais e um narrador não confiável”.. Bem, parece mesmo o meu género literario.. 🙂

    Já ha muito tempo que quero ler esse livro mas ainda nao tive oportunidade.. 🙂

    A verdade e que espero le-lo em breve! 🙂 E gostar pelo menos tanto como tu..

    Boas leituras!! 😉
    no-conforto-dos-livros.webnode.com




  5.  

    Ooi
    Até gosto de alguns suspenses, mas esse não me agradou muito. Ainda mais sendo fraco como disse.
    Vejo que não gostou, que pena. Que venham leituras melhores haha
    Beijoos!
    http://www.estantemineira.blogspot.com




  6.  
    Driely Meira

    Oiee ^^
    Eu tenho esse livro aqui desde a Black Friday, se não me engano, mas como não sou muito fã de suspense, estou enrolando bastante para iniciar a leitura. Só tinha visto resenhas positivas dele até agora, então fiquei um pouco surpresa quando vi que o livro não te encantou. É uma pena, acho que eu também não vou gostar dessas personagens descontroladas e dependentes *-*
    MilkMilks
    http://shakedepalavras.blogspot.com.br




  7.  
    Deise Blanco

    Achei super interessante o que vc escreveu a respeito desse livro. Eu acabei de ler e super concordo com vc.
    Achei um livro fraco, mal contado, mal escrito. Uma leitura cansativa, personagens cansativos e que não cativam o leitor. Pelo contrário a gente sente raiva de todos eles durante todo o livro!!!
    Não gostei da forma que ela mostrou os personagens femininos, achei bem ruim mesmo.
    Enfim lendo o que vc escreveu, e não me senti sozinha na minha opinião sobre esse livro.
    Eu já livros ruins, mas esse ta de parabéns!!!!





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