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O orfanato da srta. Peregrine para crianças peculiares.

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Posted 08/31/2016 by in Infantojuvenil

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Nota:
 
 
 
 
 

2/ 5

Sumário

Genero:
 
Autor:
 
Editora:
 
Idioma Original:
 
Título: O orfanato da srta. Peregrine para crianças peculiares.
 
Título Original: Miss Peregrine`s Home for Peculiar Children.
 
Tradução: Edmundo Barreiro / Marcia Blasques.
 
Edição: 2015.
 
Páginas: 336.
 
Capa: Vivian Oliveira / Yefim Tovbis.
 
Resumo:

O orfanato da srta Peregrine para crianças peculiares é um livro que impressiona mais pela natureza das fotografias que apresenta do que pela história que conta.

by Rodrigo Lopes C. O. de Azevedo
Full Article

O orfanato da srta. Peregrine para crianças peculiares é um livro que não se sustenta além de seu chamariz: complementar uma história de apelo infantojuvenil com o uso contextualizado de fotografias antigas. Contendo uma estrutura narrativa movimentada única e exclusivamente pela estupidez de seus personagens, o romance de Ransom Riggs surge como uma tentativa falha de trazer uma proposta nova ao gênero.

O protagonista do livro é um adolescente chamado Jacob.  Durante toda sua infância, ele ouviu as histórias mais maravilhosas sobre o tempo em que seu avô, Abe, passou em um orfanato mágico, onde as crianças demonstravam ter poderes incríveis: uma menina era capaz de flutuar, enquanto um garoto conseguia levantar uma rocha enorme com apenas uma mão. Os pais de Jacob, entretanto, repudiavam as ideias do velho e conseguiram convencer o menino de que tudo era fantasia. Anos mais tarde, quando Abe faz uma ligação desesperada alegando estar sendo perseguido por um monstro, Jacob decide partir em uma viagem para tentar desvendar o passado do avô.

O início de O orfanato da srta. Peregrine é sua melhor parte. Jacob é introduzido como um protagonista ativo, que não hesita em confrontar pessoas e fazer as perguntas corretas. O garoto, porém, vive em conflito, não sabendo se deve acreditar em seus pais ou no avô. O fantasioso seduz Jacob – que, quando menino, ficou decepcionado de não ter nascido na época das Grandes Navegações para desbravar o desconhecido –, mas ele não é imune à lógica dos pais e de seu psiquiatra Goland, que sempre arranjam explicações plausíveis para o ocorrido.

Uma delas é uma inusitada alegoria com antissemitismo. Os pais de Jacob contam que seu avô é judeu e, por causa disso, foi perseguido durante a Segunda Guerra Mundial. Explicam que os contos sobre monstros foram o jeito que Abe arranjou para lidar com a situação e que, por mais que os nazistas tenham sido de fato monstruosos, até onde se sabe, não chegavam a ter tentáculos saindo pela boca. Trata-se de uma analogia pesada, desenvolvida de forma muito pouco elegante para um livro infantil: Rigg joga a ideia de uma vez só no inicio e depois a ignora até o clímax, quando a retoma com uma fala do vilão, além da relação óbvia com o cenário.

Ainda mais tensas que essa alegoria são as fotografias apresentadas ao longo do livro, que revelam as crianças do orfanato. Há sempre algo de esquisito nas imagens para prender a atenção do leitor, seja um olhar fixo inadequado ou uma vestimenta que não condiz com o contexto. Em termos mais técnicos, as fotos mostram-se fascinantes devido ao contraste de verossimilhança que causam: elas são retratos do fantasioso, a prova de algo impossível, contraditórias em essência.

No entanto, assim que Jacob encontra o orfanato de Peregrine, a narrativa simplesmente desanda. O início até contem sua parcela de defeitos, como a mencionada falta de sutileza, o excesso de lições de moral e frases de efeito de Jacob – o livro é narrado em primeira pessoa –, além de uns simbolismos incrivelmente forçados (a mãe do menino chama a chuva em um dia ensolarado de “lágrimas de órfãos”), mas a partir da metade o autor perde completamente o rumo.

Primeiramente, Riggs adia o ponto de virada para o clímax de forma artificial ao fazer Jacob mentir para Peregrine, sem qualquer razão, sobre as circunstâncias de determinado acontecimento. Uma coisa é sonegar informações de pessoas que podem não acreditar nele – embora o garoto adore contar o que viu justamente para elas –, outra bem diferente é fazer isso com uma mulher que consegue se transformar em ave. Sem contar que o garoto jamais para para pensar que, a partir do momento em que uma parte da fantasia de seu avô é provada correta, a outra, muito provavelmente, também será.

Em segundo lugar, o autor começa a escrever reflexões e descrever situações que simplesmente não fazem sentido. Em uma cena, por exemplo, o protagonista pondera sobre a estranha vestimenta de seu avô em uma fotografia (“Quem usa terno numa viagem de caça? Agora eu tinha minha resposta: alguém que está à caça de mais de que apenas animais”) e chega a uma conclusão que só seria válida se ele tivesse acabado de descobrir que o avô faz parte da equipe dos Homens de Preto. Em outra, Jacob narra que um garoto chamado Millard não quis fazer parte de uma arriscada fuga – privando o grupo de suas habilidades – e que precisou ser subornado só para não os entregar, ignorando completamente o fato de o plano de fuga ter partido do próprio Millard. Afinal, quem bola um plano secreto e depois pede suborno para não contar a todos sobre ele?

Todavia, quanto à construção de cenas, Riggs só chega mesmo ao fundo do poço quando faz com que o protagonista chame a atenção do inimigo, para permitir que sua amiga escape, mas saia correndo justamente para a única saída que ela poderia tomar. Ou seja, como Jacob não pretendia matar seu oponente e nem acreditava estar em condições de fazê-lo, seu plano só tinha o potencial de piorar a situação da garota. 

O autor falha até em contextualizar direito as fotografias. Riggs, por exemplo, coloca duas imagens de uma mesma dupla assustadora de bailarinas, mas jamais aponta para a existência delas na história, o que enfraquece a ideia de que as fotografias representam os personagens. Além disso, ele decide apontar que três delas eram da mesma personagem, embora as garotas nas imagens sejam bem diferentes. Por fim, é bom lembrar que as fotografias serem perturbadoras é muito mais mérito dos fotógrafos do que do autor.

O orfanato da srta. Peregrine para crianças peculiares é um livro que impressiona mais pela natureza das fotografias que apresenta do que pela história que conta. Afinal, esta é protagonizada por um garoto cujas decisões e reflexões revelam-se cada vez mais ilógicas.

por Rodrigo Lopes C. O. de Azevedo.

31 de agosto de 2016.


About the Author

Rodrigo Lopes C. O. de Azevedo


11 Comments


  1.  
    Jonatas

    Li o livro a procura dos bons comentários que li sobre o mesmo. O fato de produzirem um filme também me chamou a atenção. Terminei de lê-lo sem entender o porque de tanto alvoroço.




  2.  
    Rodrigo Lopes C. O. de Azevedo

    Agradeço o comentário! Espero que a crítica tenha conseguido explicar alguns dos problemas da obra. Abraços!




  3.  
    Thaís Soler

    Ao começar a ler tive a impressão que iria gostar porque, como você colocou bem, o início é a sua melhor parte. Mas do jeito que a história foi sendo contada, fica aquele estranhamento e não é pelas imagens, mas porque o autor se perdeu na construção do enredo, dos personagens. Tinha uma proposta bem interessante, mas não soube entregar… (na minha opinião)




  4.  
    Hoxton Hoxworth

    Li coisas boas a respeito desse livro, textos bem redigidos rasgando seda e tudo mais. Eu estava interessado nele, mas depois dessa análise eu perdi quase todo o interesse. Ainda irei ler, provavelmente, me torturar um pouco, aprender o que NÃO fazer em minhas histórias, mas com certeza eu vou comprar em um sebo por um preço bem barato. Aliás, não sei se você aceita recomendações, mas vou recomendar que você NÃO leia A Batalha do Apocalipse. Não achei no site, então presumo que não tenha lido. É simplesmente o pior livro que eu já li. O autor melhorou bastante com o as obras seguintes, mas esse primeiro livro é terrível. Se quiser se torturar um pouco vá em frente e leia ele, vai que você faz uma review negativa a respeito dele, seria novidade, porque todos falam tão bem que eu até questione se de fato leram o mesmo livro que eu.




  5.  
    Fabio

    Concordo plenamente com essa critica. O livro prende a gente por causa das imagens que trazem um mistério muito grande pra qualquer leitor, mas depois a historia vai perdendo a lógica e deixa muita coisa a desejar. Fiquei meio decepcionado, confesso. To lendo agora Miss Fauna e espero que seja tão bom quanto estão dizendo.




  6.  
    Fabio

    Esse mesmo. Mano, curti muito. É ação e aventura, fiquei bem grudado na história




  7.  
    Ari

    Achei bom o livro, ao contrário de você eu não curti o começo, quando ele chega na ilha é que fica melhorzinho, bom é uma história diferente, pelo menos foge dos livros infanto-juvenil como os crepúsculos e o se eu ficar….Já que você gostou tanto da fotografia e elas fazem parte do livro acharia correto 3 estrelas mas é apenas minha opinião e é bom ter lido seu ponto de vista parabéns…




    •  
      Rodrigo Lopes C. O. de Azevedo

      Olá Ari, sempre que o texto de uma das minhas críticas sugerir uma nota diferente para você, vá com ela. Eu aponto os defeitos e as qualidades de uma obra e ofereço um espaço para expandir a discussão, mas cada um pode pesar esses defeitos e qualidades de forma diferente. Abraços.




  8.  
    Dayane

    O livro precisa de um leitor que tenha uma sensibilidade, digamos uma certa imaginação que começa nas primeiras palavras lidas e que viaje na primeira fotografia (que aliás são todas surreais mais com uma tremenda simplicidade que nós trás a certeza verídica de tudo que estamos lendo e vendo) e que nos leva a atravessar uma “fenda” e entrar em um mundo cheio de aventuras e fantasias onde só quem tem algo “diferente”que consiga pelo menos por um minuto sair desse mundo “crítico”onde acreditar e embargar em fantasias e sonhos não tem lógica e que o mais importante e mais racional a se fazer é verificar se os contextos não contem falhas e se todas as fotografias de um livro foram apresentadas pois seria “ilógico” dar vida à fotografias “perdidas”… Bem acho que só quem tem algo “peculiar” consiga atravessar essa “tal fenda” para o incrível mundo da imaginação… algo que infelizmente talvez você não possua!





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