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O Príncipe da Névoa.

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Posted 03/23/2015 by in Infantojuvenil

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Nota:
 
 
 
 
 

3/ 5

Sumário

Genero:
 
Autor:
 
Editora:
 
Idioma Original:
 
Título: O Príncipe da Névoa.
 
Título Original: El príncipe de la niebla.
 
Tradução: Eliana Aguiar.
 
Edição: 2013.
 
Páginas: 180.
 
Capa: Ventura Design.
 
Resumo:

O Príncipe da Névoa é um livro que inicia de forma eficiente, contendo uma premissa interessante e personagens cativantes à primeira vista. No entanto, Zafón larga de mão mais da metade dos personagens e das subtramas que construiu tão bem; joga tudo para o alto e resolve a história do livro de um modo um tanto quanto controverso.

by Rodrigo Lopes C. O. de Azevedo
Full Article

Carlos Ruiz Zafón avisa em sua nota do autor que O Príncipe da Névoa se diferencia de seu maior sucesso, A Sombra do Vento, por ter um enfoque infantojuvenil. Essa nota, entretanto, soa estranhamente como um alerta, como se o autor enxergasse certa fragilidade em sua história e temesse que ela fosse decepcionar seus fãs. A verdade é que O Príncipe da Névoa é somente o primeiro livro de Zafón, apresentando, assim, falhas que podem ser resultantes de sua falta de experiência na época.

 O protagonista de O Príncipe da Névoa é Max, filho de um relojoeiro chamado Maxmiliam Carver. No dia de seu aniversário de 13 anos, Max recebe a notícia de que terá que se mudar para uma pequena e isolada cidade no litoral do país, deixando para trás seus amigos e hábitos. A casa em que vai morar, contudo, possui um passado terrível e não demora até o garoto sentir a atmosfera sufocante que cerca o local e que parece emanar de um misterioso e abandonado jardim de estátuas que existe logo atrás da propriedade.

Zafón não perde tempo em revelar quais são os elementos importantes da história. Logo nos primeiros capítulos ele apresenta o mistério acerca do jardim de estátuas e o relaciona ao senhor que construiu o farol da cidade e a seu filho adotivo, Roland, o novo melhor amigo de Max. O livro, portanto, encanta e prende a atenção em seus primeiros momentos, com diversas pistas sendo entregues ao leitor – os símbolos estranhos, os sonhos de Roland, o gato preto de Irina, irmã mais nova de Max – justamente com o intuito de acelerar o ritmo da narrativa.

O desenvolvimento dos personagens também merece elogios no início da história, com destaque para a relação entre os componentes da família do garoto. O pai de Max, por exemplo, surge como uma figura inspiradora, repleta de energia, que transmite a confiança necessária para validar a decisão de ir morar em um local desconhecido. Já sua mãe se mostra uma pessoa quieta e introspectiva, o que não a impede de reparar na fragilidade dos argumentos e das ações do marido, agindo pontualmente para dar suporte a ele.  É visível, aliás, que a função da personagem na narrativa – servir como complemento à personalidade de Maxmiliam Carver, por oferecer uma perspectiva diferenciada sobre ele – é uma estratégia que Zafón utilizará com frequência e em maior escala em A Sombra do Vento.

Mas é o tratamento dedicado à relação entre Max e sua irmã mais velha, Alicia, que surpreende pela delicadeza. Essa característica é mais evidente quando, em um jantar de família, o rapaz repara que sua irmã estava em silêncio durante toda a refeição – que “seu olhar ausente parecia proclamar aos gritos como estava longe dali, mas por algum motivo que Max não conseguia entender, ninguém além dele percebia –  ou talvez fizessem de conta que não viam” – e faz um convite inesperado, provando que um simples ato de carinho pode encurtar muito o distanciamento entre duas pessoas.

Todavia, apesar de escrever um livro infantojuvenil, o autor não evitou trabalhar com temas pesados, temas esses que chegam até a ditar várias ações e acontecimentos da história. O pai de Max, por exemplo, decidiu se mudar para uma cidade pequena e isolada no litoral do país em uma tentativa de fugir da guerra – a história transcorre no ano de 1943 – e a mesma espreita os pensamentos de Max e de Roland quanto à possibilidade de um futuro alistamento. Já a trama principal, que envolve o passado da casa, é caracterizada por tragédias familiares, pactos demoníacos e morte.

Esses aspectos de histórias de terror são empregados no livro de forma consideravelmente eficaz em seu intuito de chocar e perturbar. Nas cenas em que surgem, Zafón aumenta a tensão deliberadamente com o uso de descrições de imagens, ruídos e objetos clássicos do gênero, como névoas espessas, arranhões dentro de armários trancados e os sempre assustadores palhaços. Esses elementos vão se tornando cada vez mais presentes com o decorrer dos acontecimentos, o que certamente ajuda a tornar a natureza do antagonista mais orgânica na narrativa.

O Príncipe da Névoa, consequentemente, começa de forma promissora, apresentando diversos mistérios intrigantes e uma boa dinâmica entre os personagens principais. É uma pena, portanto, constatar que a partir da metade do livro Zafón começa a deixar a impressão de que não sabia exatamente para onde iria levar sua história e de que, na realidade, decidiu atirar para todos os lados para ver onde acertava. Dessa forma, os diversos elementos misteriosos que incluiu acabam por se revelar pistas falsas (Red Harrings): o gato preto de Irina, o relógio que Max ganha de aniversário, o livro de Copérnico, entre muitos outros exemplos, decepcionam porque prometem apresentar uma função que na verdade nunca irão ter, eventualmente desaparecendo na narrativa ou sendo apenas mencionados brevemente. Ou seja, vários desses objetos recebem certo destaque no início, sendo responsáveis por desviar a atenção do leitor de um ponto específico para prendê-la em outro, mas são completamente descartados no fim sem qualquer propósito.

O clímax também deixa diversas perguntas em aberto, resolvendo todo o entrave de forma até curiosa, mas – justamente por falhar em conectar os variados elementos da história –, de maneira alguma satisfatória. E alguns personagens, como o velho do farol e os pais de Max, são igualmente descartados por Zafón: os pais chegam até a parecer um fardo para o autor, que os remove deliberadamente de dois terços do livro. Seu diminuto tamanho – 180 páginas –, consequentemente, se faz notar, já que essa grande quantidade de elementos postos de lado sugere que bem mais espaço poderia ter se mostrado fundamental para que eles pudessem ter sido devidamente explorados.

O Príncipe da Névoa é um livro que inicia de forma eficiente, contendo uma premissa interessante e personagens cativantes à primeira vista. No entanto, Zafón larga de mão mais da metade dos personagens e das subtramas que construiu tão bem; joga tudo para o alto e resolve a história do livro de um modo um tanto quanto controverso. No fim, os problemas do livro são devidos à sua história e à direção que o autor decidiu levá-la, e não ao tom supostamente leve que foi conferido a ela. 

por Rodrigo Lopes C. O. de Azevedo.

Publicado originalmente em 18 de Julho de 2014.


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Rodrigo Lopes C. O. de Azevedo


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