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Return of the Crimson Guard.

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Posted 05/04/2018 by in Fantasia

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1/ 5

Sumário

Genero:
 
Autor:
 
Editora:
 
Idioma Original:
 
Título: Return of the Crimson Guard.
 
Título Original: Return of the Crimson Guard.
 
Tradução: Lido no original.
 
Edição: 2009.
 
Páginas: 816.
 
Capa: Steve Stone.
 
Resumo:

Return of the Crimson Guard marca o primeiro volume verdadeiramente ruim sobre o universo Malazano, contando com uma narrativa inchada, travada e aborrecida. O livro anterior de Esslemont podia ser simples, mas era correto. Aqui, sua ambição apenas afoga as poucas qualidades do romance em um oceano de problemas.

by Rodrigo Lopes C. O. de Azevedo
Full Article

Return of the Crimson Guard é o segundo romance de fantasia escrito por Ian C. Esslemont que complementa a narrativa principal contada na série The Malazan Book of the Fallen, de Steven Erikson. Se o volume anterior, Night of Knives era simples tanto em estrutura, quanto em temática, aqui Esslemont almeja uma complexidade similar a de Erikson, apostando na multiplicidade de pontos de vistas, tramas e conflitos. O autor, todavia, se perde em meio a sua ambição, trazendo diversos personagens mal desenvolvidos, uma prosa problemática, discussões contraditórias e um clímax equivocado.

Como o título indica, a história de Return of the Crimson Guard segue o retorno da Guarda Escarlate ao jogo político, após décadas desaparecida. A Guarda é um grupo mercenário que jurou acabar com o Império Malazano e que encontra nesse juramento não somente sua razão de ser, mas seu poder e sua maldição, uma vez que os membros que realizaram os votos não conseguem morrer até que eles sejam cumpridos. Enquanto isso, aliados do antigo Imperador Kellanved se reúnem em uma rebelião contra a atual Imperatriz Laseen, que, por sua vez, precisa se preocupar com maquinações políticas internas e um possível golpe de estado por seu vil conselheiro Mallick Rel.

Dentro da Guarda, o ponto de vista principal é de um recruta chamado Kyle, cuja posição de iniciante permite que o personagem funcione como a ponte entre o leitor e aquele universo fantástico, com várias explicações sendo oferecidas a ele. Apesar de ser o melhor candidato a protagonista do livro – devido a estar relacionado com o grupo do título, ser o nome mais mencionado, e abrir o primeiro capítulo –, seu arco narrativo é anticlimático. O conflito de Kyle advém de uma fatalidade que ocorre no início do romance: servindo a Guarda Escarlate, ele presencia o que parece ser o assassinato de uma divindade de sua religião, um evento que o deixa dividido quanto a suas alianças e que entorpece seus sentidos, tornando-o indiferente à violência e à morte: “He could stare at them now, at anyone dead or alive, and not see them”.

Apesar de ser um tema importantíssimo para a série, essa indiferença de Kyle não é desenvolvida, mas rapidamente descartada em prol de uma conspiração interna dentro da Guarda Escarlate, que faz Kyle virar um fugitivo. A partir desse ponto, o personagem poderia ter tido qualquer personalidade e conflito interno que não faria a mínima diferença, pois Esslemont ignora o que foi apresentado até então para tratar Kyle como uma mera ferramenta para a trama, colocando-o numa busca que não é influenciada por suas características próprias. De vez em quando, o personagem lembra “Pô, mataram meu deus, né”, mas logo releva esse inconveniente e permanece seguindo seu curso em prol da Guarda.

Os outros personagens não se saem melhor e, infelizmente, há incontáveis deles. Um grupo de soldados malazanos, liderado pelo capitão Storo, ganha destaque no início do romance, enquanto tenta retomar e defender uma cidade de um exército rebelde. Se essa trama proporciona alguns acontecimentos importantes, os personagens que a protagonizam não fazem jus a eles, mostrando-se desprovidos de qualquer complexidade. Alguns deles, por exemplo, são definidos por seus traços marcantes: o mago Silk, por seu sorriso e segredos, e o guerreiro Rell, por sua habilidade como espadachim. Já os sabotadores nem isso, confundindo-se uns com os outros: qual a diferença entre Sunny e Shaky? Para finalizar, Storo destaca-se unicamente por ser o líder e fazer escolhas difíceis, e Hurl, o ponto de vista principal do grupo, é caracterizada por seus traços excêntricos – como odiar cavalos – e por ser assombrada à exaustão pelas consequências do dilema que eles eventualmente enfrentam.

Repetição, aliás, é um elemento constante em Return of the Crimson Guard, principalmente na composição dos personagens. O sorriso de Silk, por exemplo, é retratado em determinado momento como sedutor: “Silk answered with an enigmatic smile of his own – one that Hurl had seen turn many a girl’s head”. Apenas três páginas depois, porém, essa mesma descrição volta, reforçando o caráter sedutor do personagem: “He gave his most charming smile – the one that she’d seen never fail any female. Any except her”. E então, quatro páginas depois, o sorriso é mencionado mais uma vez só para garantir: “He flashed his most winning smile, the warm yet teasingly distant, slightly impish expression. That captured camp followers and slave girls”. Após três descrições similares da mesma característica em menos de dez páginas, espera-se que ela irá impactar a trama de alguma forma para compensar, mas não: o sorriso de Silk é apenas o sorriso de Silk.

Entretanto, tanta repetição serve, pelo menos, para marcá-lo na memória. Afinal, muitos dos outros personagens não possuem a mesma sorte: como a narrativa navega entre pontos de vista variados, e permanece tempo demais distante de alguns, isso torna laborioso para o leitor lembrar quem é quem. Seus nomes notadamente não contribuem para a causa, visto que os personagens parecem participar de um jogo de aliteração altamente aleatório: Shell, Shen, Sept, Silk, Su, Sour, Skinner, Smoky, Stoop, Stalker, Storo, Slate, Sunny, Sessin, Shaky, Shijel, Shellar, Shimmer. Começando com C: Cowl, Cole, Coil, Choss, Chord, Coots. Na mesma companhia da Guarda Escarlate, de apenas doze integrantes, há um Balkin, um Black, um Baker e um Bower.

Esslemont também não confere uma voz marcante a eles, o que agrava o problema. Os diálogos no livro são cheios de frases de efeito (“You are playing a dangerous game” / “That is the only game worth playing”), clichês (“Nothing personal, you understand. Just business”) e exposição desnecessária. Em certo momento, Chord explica ao porta voz de um grupo de saqueadores que comiam carne de cavalo Wickan: “Wickans regard their horses like members of their own family. They’d no more sell one of them than their own daughters”. No entanto, os saqueadores claramente sabiam da importância dos cavalos, visto que seu objetivo era justamente humilhar os Wickans que eles tanto odiavam. Chord sabe disso também, por sua expressão de desprezo. Ou seja, o diálogo expositivo acaba sendo direcionado mais ao leitor, para lembrá-lo da cultura Wickan, do que para o interlocutor do personagem que já sabe essa informação.

Outro sintoma da inexistência de personalidade nos diálogos é o fato de eles compartilharem das mesmas idiossincrasias do autor independentemente do contexto. Personagens não precisam todos usar expressões diferentes, mas o fato de eles compartilharem da mesma particularidade não é um bom sinal para sua individualidade. Aqui, por exemplo, Esslemont mostra uma preferência desmedida por construções similares a “Surely, you can write better characters” e ela aparece na boca de assassinos, nobres, engenheiros, deuses, capitães e soldados, chegando a surgir duas vezes em uma mesma reflexão:

Would he accept? Surely they were finished now; how could they beat more than they’d faced so far? They’d had a damned good run. In truth, they got farther than she’d thought possible. Then she blinked away the sweat and salt stinging her eyes. Damn this mind-numbing exhaustion! These pirates would cut them down the minute the weapons left their hands! Surely the Captain must know that.”

Para efeito de comparação, esse tipo de construção aparece somente cerca de seis vezes em Gardens of the Moon e apenas três em Deadhouse Gates. Na primeira trilogia inteira de Mistborn, aproximadamente dezenove vezes. Já Return of the Crimson Guard sozinho conta com vinte e sete aparições dessa construção. Dentro da própria obra de Esslemont, Night of Knives, mesmo com seu tamanho reduzido, conta com oito episódios dela e o próximo volume, Stonewielder com alarmantes trinta e três.

Ainda sobre o estilo, Esslemont também peca com a quantidade de períodos simples que travam o ritmo da narrativa. Há diversos trechos que poderiam servir de exercício de inglês com o comando “Construa períodos compostos com algumas das frases abaixo”, como o seguinte comprova: “The Cellar beneath was no more than a vaulted-roof grotto. Armed and armoured men stood shoulder to shoulder. They numbered about thirty. Kyle recognized fewer than half.” Essa profusão de períodos simples não cumpre uma função importante para justificar a leitura pausada que causa: a cena em questão, por exemplo, não é um momento de tensão extrema ou de recuperação após um, o que poderia até significar um espelhamento do ritmo da narrativa na sintaxe. Trata-se, na verdade, de uma cena ainda no primeiro capítulo, quando o leitor sequer conhece bem os personagens que está acompanhando. E tal estilo percorre o romance inteiro, não se resumindo a esse instante. Mais para frente, por exemplo, em um momento ainda mais desprovido de ação, há o seguinte trecho que revela o mesmo problema: “The next day a small boat entered the bay. An old man rowed it. He tied it up at the least decrepit dock. The men of the blade watched from cover.

Quanto aos personagens, a única desenvolvida satisfatoriamente em Return of the Crimson Guard é a Imperatriz Laseen, que surge tão enigmática quanto era na obra de Erikson e no volume anterior de Esslemont. O autor, entretanto, chega a explorar alguns lados ainda não expostos dela, como sua habilidade em batalha, e deixa transparecer um pouco da humanidade de Laseen ao sugerir certa melancolia em sua postura sempre rígida. Não obstante, aqui a Imperatriz é, em sua maior parte, desenvolvida em contraposição a seus oficiais principais: Korbolo Dom e Mallick Rel. Essa contraposição funciona, impulsionando o leitor a simpatizar com ela, mas isso não torna a personagem mais complexa: todo mundo parece ter bom senso quando comparado a Korbolo Dom, ou ter escrúpulos ao ser comparado a Rel. Sobre ela ter deixado os dois assumirem o posição que tem, o leitor só irá se frustrar ao perceber que ninguém jamais chega para Laseen e, apontando para os dois incrédulo, exclama no estilo de Esslemont: “Surely, you can’t be serious!”. Afinal, nesse caso, a resposta de Laseen certamente seria: “I’m serious, and don’t call me Surly”.

Já uma personagem sem qualquer ponto positivo é a princesa Ghelel, introduzida numa cena similar a um confronto com Arya em A Guerra dos Tronos: buscando torná-la prisioneira política, atacam a garota durante seu treinamento de espadachim, quando ela é defendida pelo próprio treinador, que prova ser mais do que alegava ser. Depois desse evento, Ghelel se junta à rebelião, mas faz absolutamente nada durante todo o romance e nem no final. Ela permanece uma personagem de reação, com seus breves momentos de proatividade mostrando-se fúteis, servindo unicamente para ela se autoafirmar independente de forma tola.

Tematicamente, Return of the Crimson Guard abre com um poema sobre conflitos eternos e a rejeição de quem tenta impedi-los – o que funciona com a tragédia da Guarda Escarlate – e joga o tempo todo com o embate entre o “velho” e o “novo”: um grupo chamado “Old Hands”, por exemplo, que serviu Kellanved, agora se opõe a nova Imperatriz Laseen, enquanto dentro da própria Guarda há discórdia entre membros antigos, como Skinner, e novos, como Graymane. No entanto, o embate está em todos os lugares, com velho matando o velho, principalmente no clímax, e o novo matando o novo, o que torna todo o destaque um tanto arbitrário: ele faria mais sentido em uma narrativa preocupada com a repetição do passado, como The Bonehunters, do que em uma que contém uma guerra generalizada.

O clímax, por sinal, foca no personagem errado. Kyle mal aparece – e mal tem um clímax próprio também –, a equipe de Storo está preocupada com outro problema, Laseen acertadamente fica no pano de fundo, e Ghelel sequer participa do evento, o que leva um soldado até então coadjuvante a assumir o posto de protagonista. Toda a construção de seu grupo de engenheiros de explosivos é divertida, justamente por engenheiros malazanos sempre serem excêntricos, mas não há o investimento emocional que poderia haver caso esse personagem fosse o foco principal desde o início.

Assim, Return of the Crimson Guard marca o primeiro volume verdadeiramente ruim sobre o universo Malazano, contando com uma narrativa inchada, travada e aborrecida. O livro anterior de Esslemont podia ser simples, mas era correto. Aqui, sua ambição apenas afoga as poucas qualidades do romance em um oceano de problemas.

por Rodrigo Lopes C. O. de Azevedo.

04 de maio de 2018.

 


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Rodrigo Lopes C. O. de Azevedo


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